A última moda no século 19 era a previsão do futuro. Com o desenvolvimento da mecânica de Newton, e com o aprimoramento dos telescópios da época, cada vez mais os astrônomos conseguiam prever eclipses e passagem de cometas. Um deles, Pierre de Laplace, conseguiu prever pequenas perturbações na órbita de Saturno devido à influência gravitacional de Júpiter. Empolgado com a descoberta, ele disse que seria capaz de prever qualquer fato do futuro, desde que conhecesse a posição e velocidade de todos os corpos do universo em um dado instante.
Hoje em dia, nós sabemos que Laplace foi precipitado ao fazer a afirmação acima. Primeiro, porque a mecânica quântica não é determinística, e por isso qualquer previsão tem sempre uma margem de erro impossível de evitar. Segundo, porque mesmo que o universo fosse completamente determinístico, as previsões ainda seriam muito díficeis de serem avaliadas, pois o sistema é caótico, ou seja, apresenta imensa instabilidade ao parâmetros iniciais (as previsões ficariam cada vez mais pobres quanto mais você se afastasse do instante de medida).
Atualmente, qualquer engenheiro recém-formado tem mais conhecimento que tinha Laplace em sua época. Entretanto, não há como negar que Laplace foi um gênio! Afinal, desenvolver toda a teoria das transformadas de Laplace a partir do zero é muito mais difícil que simplesmente aprendê-las em aula para depois projetar alguns circuitos.
Pois outro dia eu descobri o trabalho de um russo maluco que me lembrou na hora da história acima. Alguns anos atrás, eu queria fazer um programa para rodar jogos do videogame Master System no meu computador. Os jogos normais foram simples de emular, mas deparei-me com uma problema: como rodar os jogos que precisavam de óculos 3D?
No computador eu não tinha como encaixar os óculos originais, então a saída foi improvisar: peguei um par velho de óculos da minha avó, tirei as lentes, e coloquei no lugar celofane azul e vermelho. O celofane servia como filtro, deixando passar apenas os raios de luz azuis e vermelho, respectivamente. Depois foi só fazer o computador desenhar na tela as imagens do olho esquerdo em azul e do direito em vermelho, para fazer a pessoa usando os óculos conseguir ver uma imagem diferente em cada olho, gerando o efeito tridimensional.
É claro que não tem nada de mais na minha solução, é uma técnica bem conhecida na literatura. Curioso mesmo foi descobrir que o russo Sergei Mikhailovich Prokudin-Gorskii já tinha descoberto esse truque em 1909, e o utilizado para tirar fotos coloridas antes da fotografia colorida ter sido inventada!
A técnica do russo era simples, mas genial: ele tirava três fotografias em preto e branco da cena desejada; mas, antes de tirar as fotos, colocava uns filtros coloridos na frente da lente. Dessa maneira, cada uma das chapas continha informação de apenas uma componente cromática da cena.
Para apresentar as fotos coloridas, ele usava um projetor de slides com três lâmpadas, de cores iguais àquelas dos filtros utilizados nas lentes. Ajustando as três imagens para ficarem uma em cima da outra, o efeito final era a composição das três chapas monocromáticas, formando a imagem colorida!
O método do russo só não pegou pois tinha um defeito que não podia ser contornado na época: as cenas tinham que permanecer estáticas por muito tempo. Se algum objeto estivesse se movendo, as três chapas gravariam imagens diferentes, gerando borrões coloridos na imagem (isso é bem perceptível em fotos de rios e naquelas que aparece fumaça se mexendo).
O trabalho espetacular de Sergei tem uma relevância extra, pois ele tirou as únicas fotos conhecidas de igrejas russas que mais tarde foram destruídas na revolução. A fotografia colorida como a conhecemos só seria inventada na década de 30, o que torna o trabalho de Sergei tão inventivo quanto o de Laplace!
Para quem quiser conhecer as fotos, basta acessar o site abaixo, onde as três chapas foram unidas com o Photoshop em imagens para download: